domingo, 7 de fevereiro de 2010

Lamento evangélico

Ontem à noite, quando voltava para casa, observei o fluxo contínuo de muitas pessoas com muletas. Uma, duas, três, quatro. Todas elas passavam ou perto de mim ou do outro lado da calçada. Junto delas, havia pessoas carregando Bíblias. Ouvindo uma conversa de ponto de ônibus, deduzi o que acontecia nas redondezas: toda aquela gente foi atraída até uma igreja.

O andar de um senhor com suas muletas, voltando daquela reunião, chamou-me a atenção. Fitei os olhos nos olhos dele: cabisbaixo, em sua senilidade, aquele homem caminhava lentamente com suas muletas. Parecia abatido ao voltar daquele “culto”. Talvez, ele esperava voltar de lá sem as muletas.

Esse episódio me fez pensar sobre o quanto caminhamos longe do senhorio de Jesus Cristo. Os ditos “seus seguidores” – ou mesmo, “seus apóstolos” – usam desse nome para se auto-promoverem, para fazerem promessas a um povo sedento, abatido, necessitado. Além disso, essa manipulação acaba colocando fardos sobre aqueles já chamados para serem livres.

Uma moça comentava, com orgulho, ao passar perto de mim: “Pois é. Eu já sou dizimista há três anos”. Quiçá, ela se julgava privilegiada por isso e, assim, digna de bênçãos especiais. O olhar daquele velhinho denunciava desesperança. Uma multidão vagava por aquela região da cidade, indicando o frissom religioso causado por mais um dos atuais super-seguidores: mais um que prometia a solução completa para todo sofrimento.

Sinceramente, angustia-me perceber o tipo de cristianismo que se dissemina país afora. Parece que nós, brasileiros e brasileiras, insistimos em dar crédito a qualquer um e a qualquer coisa, já que presumimos não desistir nunca...

Não conversei com aquele senhor que voltava para casa com sua esperança abatida. Entretanto, pensei comigo mesmo: “O que significaria, para mim, entrar em uma reunião ‘evangélica’, cheio de esperança de ser curado, já que o pregador atraiu-me com esse argumento, e voltar para casa com as minhas velhas e conhecidas muletas?”. Acredito que aquele homem já lidou com muitos revezes na sua vida. Inclusive, caso não tenha um bom plano de saúde, enfrentou muitas filas para ser atendido no nosso Sistema Único de Saúde.

O que fizemos com o nome de Jesus? O que temos feito em nome de Jesus? Sim, temos que fazer essas perguntas se somos pessoas sérias e comprometidas com o evangelho de Cristo. Jesus não é legenda partidária. Jesus não é ideologia. Jesus não é método. Jesus não é publicidade ou propaganda. Jesus não é liquidação.

Especificamente sobre a cura – bênção maravilhosa que acontece pela intervenção do Senhor – , percebo que a estão ofertando como produto nestes dias. Há uma infinidade de “promotores de vendas” nesse ramo. Pena que o produto oferecido tem prazo de validade bastante exaurível. Pena que é mais imediatista do que duradouro. Pena porque enganamo-nos com uma pirataria dos milagres e deixamos de experimentar a completude da obra de Cristo.

Referências bíblicas: Mateus 24.11 e 12; Jeremias 4.22 e 6.14
Texto escrito em 19/09/09.

3 comentários:

Ronni Anderson disse...

Texto forte e totalmente necessário!
Friso sua última frase: "Pena porque enganamo-nos com uma pirataria dos milagres e deixamos de experimentar a completude da obra de Cristo"
Uma grande pena...

Continue sendo arauto do Rei.

Anônimo disse...

Nossa Edson, o layout novo ficou lindo! Parabéns!

Muito bom o texto também. Um contraste bem profético ao lado do texto do Steurnagel para a última Ultimado: Chamados para curar os enfermos.

Escrevi um e-mail pra você, sobre a JE em JF. Me responde, please!

Abraços da Luciana, de BH.

Josemar disse...

Em seu tempo Lutero já alertava para o perigo de transformar Cristo em Moisés... assim perdemos a doçura e o descanso que há no Evangelho.
E está difícil encontrar Cristo em muitas igrejas hj, o que faz com q pessoas como as que relatou, voltem para casa vazias, carregando fardos que não podem suportar, por vezes trazem uma que se traduz em conquistas terrenas apenas, sem enxergar no horizonte a maravilhosa graça do porvir.

Um abração,

Josemar