sábado, 14 de abril de 2012

Meninos

Os gritos da discussão espantaram quem estava por perto. O espaço para o ringue foi liberado. A ginga verbal de um deles deu início à batalha. O corpo se dobrou à tensão da voz e se armou. Os passantes seguiam a rotina do dia. Foi um soco que trouxe o inusitado para quem passava naquela rua. Os olhares desatentos viram os corpos em discussão. Um. Dois. Foram três os socos. O punho cerrado encontrou o rosto do menino. Que chorou. Menino também era o agressor. O rosto chocado pela mão do outro foi levado até a camisa do uniforme escolar. Era preciso secar as lágrimas. Não se podia chorar. Tinha muita gente olhando.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

"Os miseráveis"

Nesse primeiro bimestre escolar, trabalhei com os alunos do 9º ano do Ensino Fundamental uma adaptação do livro "Os miseráveis", de Victor Hugo. Parte da proposta de trabalho era uma apresentação em sala e o que compartilho aqui são produções dos estudantes que traduzem o impacto que a leitura da obra causou sobre eles.

"Os miseráveis" tem acentuado caráter de reflexão social. Seguir a trajetória de Jean Valjean é se deparar com conflitos humanos que ainda falam à nossa geração. Fantine, Cosette, Javert, Marius, Thénardier, Bienvenu, Fauchelevent, dentre outros, são personagens que convidam os leitores a fazer parte do universo hugoano. E cada um desses ensina uma lição diferente. Perceber que esse texto resiste à e (re)existe a partir da leitura de meninos e meninas com 13 e 14 anos é testemunhar que aquele escritor francês do século XIX, de fato, tinha algo a dizer.

O poema abaixo foi escrito pelo aluno Fernando Almeida e apresentado como conclusão de seu trabalho:
O que é miséria?
Uma coisa gerada por nós.
Onde está a miséria?
Está em todo lugar.
Quem é a miséria?
A miséria somos nós...

Não entendo essa miséria.
Não sei onde está.
Não sei onde procurar.
Mas que boba, mas que megera.

Descobri onde está.
Mas nem precisei procurar.
Descobri o que sou.
Descobri que sou um miserável
por eu mesmo gerar os miseráveis.
O vídeo a seguir é resultado do trabalho dos estudantes Ana Beatriz Vilela, Bernardo Zanetti, Caroline Dias, Gabriel Leite, Gustavo Hespanhol, Larissa Freez, Lucas Lima e Thales Buzan.
 
 

Foram as mais variadas expressões que povoaram as aulas de Língua Portuguesa quando das apresentações das equipes: música, dança, teatro e artes plásticas se aliaram à literatura e motivaram as leituras de "Os miseráveis".

Alegro-me pelo fato de perceber que os alunos têm se despertado para temáticas tão sérias e com tanta sensibilidade. Como lhes disse, acredito que nenhum deles vai se esquecer daqueles personagens e, mais, nenhum deles vai deixar de notar a atualidade, a presença dos miseráveis hoje e amanhã.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Versão 2012

Está inaugurada a nova cara do blog. É com alegria que a estreia acontece! E, falando em alegria, em breve, vem um texto sobre o lema da página para este ano. Fiquem à vontade para as visitas!

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Ato gratuito

Tenho o costume de levar alguns textos que acho interessantes para a sala de aula, compartilhando-os com os alunos. Geralmente, espero a última aula da semana para fazer isso. Depois de finalizar aquilo que estava planejado, surge no espaço-tempo pedagógico uma possibilidade de gastar – poucos que sejam – alguns minutos curtindo o texto literário apenas pelo seu prazer. E faço questão de fazê-lo de modo apaixonado.

Não é difícil, nesses momentos, ouvir perguntas do tipo “pra quê isso?”, “isso vai cair na prova?”, bem como aquelas outras que, embora não se explicitem verbalmente, manifestam-se nas expressões faciais e em risadas debochadas, por vezes, dizendo-me “você está louco?” com suas variações.

O primeiro escopo de perguntas me leva a pensar no utilitarismo pedagógico. Por este princípio, tudo o que se pretende fazer na escola é, meramente, algo possível de aproveitamento imediato, direto e verificável nas avaliações. Como avaliar, então, o despertar emocional gerado por um poema? Como avaliar, então, frente a uma obra de arte, a sensibilização de alguém para determinado aspecto da vida?

O segundo grupo de indagações não é visto por mim como algo pessoal. Antes, “você está louco?” – pergunta manifesta diante de uma leitura expressiva do texto literário – aponta para uma concepção insensibilizada da linguagem e, por extensão, da própria existência na contemporaneidade. É preciso provocar os sentidos de uma geração anestesiada pela tecnologia, ainda que isso soe como loucura por ser, essencialmente, humano.


Voltando à sala de aula, naquele momento em que ofereço à classe um texto literário pelo simples fato de doá-lo à apreciação, quero apenas deixar os estudantes diante de algo que os provoque de certo modo, que os faça pensar, que os sensibilize, que os capture em meio a tantos estímulos impessoais e automatizados que sobre eles se processam. Acredito que a literatura tem a capacidade de sensibilizar, de deslocar-nos do lugar-comum, de provocar em nós reações, conscientes ou não, sobre o que é e como se dá o existir e o ser em suas múltiplas manifestações.

Precisamos do ato gratuito, daquele momento em que a vida pode se expressar sem o peso da obrigação e da utilidade. Em um tempo determinado pelo consumo, o que é gratuito, infelizmente, passa como algo sem valor. Se a pergunta “para que serve isso?” continuar invadindo nossos atos gratuitos, vale a pena dar-lhe um nó, retrucando com um sonoro “para viver”.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

A vulnerabilidade do amor


“Amar é ser vulnerável. Ame qualquer coisa, e o seu coração será certamente torcido, e possivelmente quebrado. Se você quiser garantir um coração intacto, não o entregue a ninguém, nem mesmo a um animal. Embrulhe-o cuidadosamente com hobbies e pequenos luxos; não o deixe se amarrar a nada; tranque-o com segurança no cofre ou caixão do seu egoísmo. Mas no cofre – seguro, escuro, parado, sem ar – ele passará por uma mudança. Ele não se quebrará; antes se tornará inquebrável, impenetrável, irremediável.”


LEWIS, C. S. The four loves. Fount: Harper Collins Religious, 1998, p.116.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Eu acredito no que faço? Eu acredito no que vivo?


Por que pensar, então, que Deus não fará justiça ao seu povo escolhido, que sempre clama por ajuda? Acham que ele não vai ajudá-los? Garanto a vocês que vai, e sem demora. Mas a pergunta é: quanto dessa fé persistente o Filho do Homem vai encontrar na terra quando voltar?” (Lucas 18.6-8)

A maior parte de nossa vida se caracteriza por aquilo que chamamos de ordinário. Aquilo que chamamos de extraordinário é, justamente, o momento que foge da regra, do convencional e da rotina. Por exemplo, o estudo, o trabalho, a arrumação da cama e da casa etc., isso é ordinário. A folga, o passeio com amigos e família, o acordar mais tarde e deixar a cama desarrumada até quando decidirmos ajeitá-la etc., isso é extraordinário.

Na vida de fé não é muito diferente: os momentos extraordinários existem e, certamente, são marcantes em nossas vidas. Cada um de nós pode lembrar e contar acontecimentos que fugiram da normalidade em que, de maneira poderosa e nada convencional, percebemos Deus interferindo em nossas vidas. E é bom não nos esquecermos de que Ele é capaz de, ainda hoje, fazer “infinitamente mais do que pedimos ou pensamos” (Efésios 3.20). Entretanto, o desafio que vivemos como discípulos e discípulas de Jesus Cristo é conciliar a extraordinária revelação do Salvador e de Seu Reino com o ordinário de nosso cotidiano.

Por vezes, a rotina costuma esmagar em nós a esperança que Cristo revela. Nesse sentido, é importante lembrarmos que o próprio Senhor nos advertiu de que no mundo teríamos aflições, mas Ele mesmo venceu o mundo (João 16.33). Nosso desafio é crer contra as evidências da descrença, da desesperança e do desespero. É importante que mantenhamos a fé em nossa caminhada com Jesus, uma vez que “é impossível agradar a Deus a não ser pela fé. Por quê? Porque qualquer um que deseja se aproximar de Deus deve crer que ele existe e que se preocupa o bastante para atender aos que o procuram” (Hebreus 11.6).

O apóstolo Paulo relacionou de forma interessante três marcas da vida cristã, “temos três coisas que nos guiam até a consumação de tudo: confiança firme em Deus, esperança inabalável e amor extravagante. E o melhor desses três é o amor” (1Coríntios 13.13). Fé, esperança e amor. Que o Espírito Santo traga às nossas mentes e aos nossos corações as promessas imutáveis de Deus, interferindo extraordinariamente em nossa vida ordinária.

Para pensar e orar...
Em qual área de minha vida eu tenho tido dificuldades de crer?
Há alguma situação pessoal em que tenho vivido sem esperança?
Deixar de acreditar no que vivo e no que faço interfere no serviço ao Senhor e ao próximo?
Qual a importância de aprender a conciliar o ordinário e a esperança no extraordinário?
É possível viver com fé, esperança e amor de modo solitário?
Como a comunhão pode me ajudar a viver crente, esperançoso(a) e amoroso(a)?